Artigo: As Lições de Guerra
Era feroz na defesa de seus espaços políticos, duro nas contendas, extremamente devotado e prestativo aos amigos
Publicação: 11/03/2014
Fonte: Jornal Estado de Minas
Eleito deputado federal, cheguei ao Congresso Nacional com a recomendação de meu pai para procurar duas pessoas: Tasso Jereissati e Sérgio Guerra. No primeiro, poderia confiar em qualquer circunstância, com o outro poderia aprender muito. Sábios conselhos. Em 2007, quando das eleições para a executiva nacional do PSDB, Sérgio foi eleito presidente e eu secretário-geral. Dali para frente nunca mais nos separamos e construímos uma sólida amizade, forjada na mistura de momentos felizes e circunstâncias duras, como são as verdadeiras. No primeiro mandato como parlamentar, por meio de convivência diária e nas viagens por todo o país, me vi como privilegiado aprendiz no jogo do xadrez político. Nenhum outro presidente estabeleceu diálogo tão intenso com as bases partidárias. Coordenamos a eleição para prefeitos e o auxiliei na decisão de quem seria candidato a governador em estados importantes. Ele esforçou-se ao máximo pela unidade partidária e pela construção de um projeto viável para Presidência da República.
À frente do PSDB, escolheu como principal desafio a renovação do partido. Investiu na modernização dos processos de comunicação e na aproximação com segmentos da sociedade organizada, como mulheres, jovens, sindicatos e minorias, base fundamental para autêntica representação política. Mesmo muitas vezes debilitado, peregrinou pelo Brasil afora para, solitário, estar ao lado dos companheiros, não se importando com a direção das urnas. Nas reuniões da executiva nacional, quando eu, de maneira solidária, defendia o nome de Aécio Neves como candidato em 2010, encontrei nele um juiz imparcial. Segredou-me: “Racionalmente sou Serra, meu coração é Aécio”. Deu a este oportunidade de construir sua candidatura, porém o partido escolheu outro caminho. Imediatamente após a derrota em 2010, contrariou Serra e seus seguidores, defendendo de maneira irrestrita o nome de Aécio. Este próprio reconhece que, hoje, só é candidato graças a Sérgio Guerra.
Participou com facilidade e grande legitimidade em diferentes legendas e tendências políticas, sempre ouvido e respeitado, desde que começou a sua vida pública no anos 1980. Com enorme desenvoltura e sempre imprevisível, transitou por diferentes projetos políticos. Na juventude foi da UDN depois PMDB, esteve ao lado de Tancredo Neves desde a primeira hora. Fez parte do grupo de Miguel Arraes, rompeu com este. Esteve com Jarbas Vasconcelos, com quem posteriormente também rompeu; foi oposição ao governo FHC. Depois foi o grande responsável pelo resgate de seu nome e pela valorização de seu legado junto aos tucanos. Foi muito ligado ao governador Geraldo Alckmin. Esteve ligado ao grupo de José Serra, posteriormente de quem também se afastaria. Desta forma, foi personagem central na política brasileira nos últimos anos. Atuou como um autêntico construtor de pontes, sempre pensando na necessidade de uma ampla convergência capaz de colocar o país no rumo do desenvolvimento.
Certa vez, na Bahia, um jovem radialista o entrevistou e, ao término, entusiasmado disse: “Acabamos de ouvir o senador Sérgio Guerra, presidente nacional do PSDB, o ‘Pentágono’ do Nordeste”. A partir daí, só o chamei de Pentágono. Relapso no cotidiano, era extremamente cuidadoso nas equações políticas. As situações eram por ele analisadas à exaustão, vistas de todos os ângulos antes de uma decisão. Em geral, a mais sensata possível. Seus discursos pareciam uma conversa, sempre limpos e lógicos, sempre fortes. Era feroz na defesa de seus espaços políticos, duro nas contendas, extremamente devotado e prestativo aos amigos. Culto, exigente, mas também simples e generoso, sabia, como poucos, reconhecer valor das coisas e dos pequenos gestos, vocação trazida de suas origens, fincadas em nuanças das pequenas comunidades pernambucanas. Repetia casos e mais casos de onde tirava lições e aprendizados e, em outros, pitorescos, divertia-se repetidas vezes com o inusitado das histórias. Conversava com intelectuais e fortes empresários, sempre interessados em seu tirocínio sobre a conjuntura, mas também com a gente simples do sertão nordestino, no cumprimento de compromissos itinerantes.
Com a saúde sempre frágil, Sérgio conviveu com o crônico diabetes que o afligia, agravado, depois, pelo câncer. Outros problemas exigiram cirurgias extensas e internações quase que permanentes, mas seu grande poder de recuperação surpreendia os companheiros. Nos seus últimos momentos, deve ter pensado pesaroso na pouca convivência com Sergito, seu filho caçula. Na sua despedida, estavam Neném, a mulher da sua vida, seus filhos Chico, Elisa e Helena e correligionários de todo o Brasil. Despedimo-nos dele com um longo e emocionado aplauso em uma última e merecida homenagem.
Rodrigo de Castro
Deputado Federal (PSDB/ Minas Gerais)